31 de janeiro de 2013

Sugestões para celebrar o Imbolc


Não me deterei em explicar sobre a história e significado desse festival céltico, pois iria apenas repetir o que já está escrito em muitos bons artigos:

Então, nesse breve texto darei algumas sugestões (simples) para celebrar o Imbolc.
Como esse é um dos festivais celtas mais domésticos, por causa do extremo frio que faz essa época nas terras da Europa[1], as famílias se reuniam em suas casas, em especial diante da lareira para honrar a deusa Brighid que em breve traria o Sol e o calor. Preces, canções, atos mágico-religiosos e oferendas eram feitas para a proteção da casa, da família e dos animais.

No dia 1 de fevereiro (ou numa data próxima) comece suas práticas religiosas para honrar e saudar esse festival[2]. Limpe sua casa, seu quarto. Faça uma faxina. Livre-se de coisas velhas, que não usa mais ou que lhe lembram de coisas ruins que aconteceram. Mude, transforme hábitos, pensamentos e atitudes negativas e viciosas.
Enquanto que em Samhain e Solstício de inverno damos mais atenção aos anciãos e antepassados, no Imbolc e na Primavera focamos nas crianças e nos pequenos.

Acenda uma vela em honra a Brighid na cozinha e se for possível coloque-a sobre ou próximo ao fogão (a nossa “lareira” hoje). Enquanto a chama queima, ouça músicas que gosta (e que Brighid talvez possa gostar também), cante cantigas para Ela (de sua autoria ou não), entoe poemas, ore a Ela e aos ancestrais, pedindo por proteção, cura, prosperidade, alegria, amor ou o auxílio para um problema em questão. Cozinhe. Faça algo inusitado ou tradicional, de família ou seu em particular. Ao ficar pronto compartilhe do alimento com amigos e parentes queridos, e ofereça um pedaço a Brighid (enterre, queime, deite sobre um rio ou deixe no altar por um tempo). Você pode oferecer também leite, mel, água, um arranjo de flores ou uma arte feita por você.

Ao sol se pôr ou quando achar que é propício acenda uma chama (uma vela ou fogueira) e recite orações e/ou poemas para Ela. Podem ter sido criados por você ou por outra pessoa, não importa muito, contanto que sejam palavras verdadeiras, intensas e que lhe toquem a alma. Se quiser, dance para (e com) Ela. Coloque para tocar uma música animada que goste, dessas com violinos, flautas e tambores... Ou então toque você mesmo um!
Deixe sua inspiração fluir. Deixe que Brighid fale aos seus ouvidos e coração. Deixe ela entrar em sua casa e encher você e aos seus de bençãos![3]

Obs: Na região norte do Brasil não temos um inverno como na Europa ou sul e sudeste brasileiro. Nosso inverno é carregado de chuvas, e ainda assim o calor é presente. Mas a água é quem reina nessa época, e à ela devemos dedicar honra e respeito nos festivais dessa metade do ano. Brighid é também senhora que cura, deusa das águas sagradas, dos poços e fontes. Que as águas que caem dos céus e as águas que enchem os rios nos purifiquem e levem embora para o mar o que não nos serve. Que as águas de Brighid nos cure, purifique, proteja e nos encha de bençãos de fertilidade!

Poemas ou canções para Brighid

Quem é ela que tem os cabelos de fogo e olhos penetrantes?
Quem é ela da voz suave e doce canto?
Quem é ela da face mais bela e mãos que afastam o pranto?

Quem é essa que guarda os segredos da cura?
Quem é essa que doma o fogo e a água?
Quem é essa da aura pura e radiante como a lua?

É Brighid, dos cabelos de fogo!
É Brighid, da fala mais doce!
É Brighid, da alma serena!
É Brighid, dos raios de sol!

Mãe da canção,
Mãe dos poetas,
Mãe da purificação.

Luz que me guia,
Luz que me protege,
Luz que me inspira e me dá sabedoria.

Divina mulher, estejas em minha casa.
Sábia senhora, estejas em minha fala.
Grande curadora, esteja em minhas mãos.
E pelo poder dos Três,
Que eu esteja em ti
E Tu estejas em mim.

Em uma só Canção,
Dentro de um só Coração,
Em plena União.

(Darona ní Brighid, escrito em 04/01/2013)

***

Quem é ela que vem com o Sol?
Quem é?
Quem é ela que traz o calor e a alegria?
Que é ela que traz a cura e a sabedoria?
Quem é?
É Brighid!
Rainha do fogo.
Senhora do poço.
Mãe dos poetas.
Guardiã da lareira.
Matrona da família!

(Saudação a Brighid e ao Imbolc. Darona, em 29.01.13).

***

Gabhaim molta Bríde
Ionmhain í le hÉirinn
Ionmhain le gach tír í
Molaimis go léir í

Lóchrann geal na Laighneach
A’ soilsiú feadh na tíre
Cean ar óghaibh Éireann
Ceann na mban ar míne

Tig an geimhreadh dian dubh
A’ gearradh lena ghéire
Ach ar Lá ‘le Bríde
Gar dúinn earrach Éireann

Tradução:

Eu louvo Brighid
Amada da Irlanda
Amada de todas as terras
Deixe-nos todos louvá-la

A tocha brilhante de Leinster
Brilhando em todas as partes da terra
O orgulho de todas as mulheres irlandesas
O orgulho das mulheres de bondade

Vem o Inverno escuro e difícil
Cortante com a sua severidade
Mas no dia da Santa Brighid
A Primavera irlandesa está perto de nós

(Tradicional canção/oração a Brighid)


***

Brighid do manto, rodeai-nos
Senhora dos cordeiros, protegei-nos
Defensora da lareira, iluminai-nos
Sob o vosso manto reuni-nos e restitui-nos a memória
Mãe das nossas Mães, antepassadas corajosas
Guiai nossas mãos nas vossas
Para acender a lareira, mantê-la viva, preservar a chama
Vossas mãos sobre as nossas, nossas mãos nas vossas
Para acender a luz tanto de dia como de noite
O manto de Brighid em torno de nós
A lembrança de Brighid dentro de nós
A proteção de Brighid livrando a nós
do mal, da crueldade e da ignorância
Neste dia e noite, do amanhecer ao anoitecer, do anoitecer ao amanhecer.
Assim seja.

(Tradicional prece a Brighid).




[1] No inverno, os dias que precedem a primavera são justamente os mais frios. À noite, o momento que precede a aurora costuma ser o mais escuro.
[2] Antes disso (uns dias antes), sugiro que estude e pesquise sobre a história, costumes e significados desse festival.
[3] Você pode fazer tudo o que foi sugerido aqui ou mais, ou ainda apenas o que for possível. Mas faça, e com espontaneidade, alegria e verdade, e tenha certeza que Brighid lhe abençoará.





23 de janeiro de 2013

Bose Yacu Pacahuara



Hoje faleceu a indígena Bose Yacu, do povo Pacahuara, na amazônia boliviana (proximidade com o estado do Acre). Para alguns é só mais uma indígena que morreu, para outros é uma fonte enorme de sabedoria que se perdeu... Era a última que ainda falava a língua materna do povo Pacahuara, que conhecia canções tradicionais e guardava um enorme conhecimento de seu povo, hoje ameaçado de extinção, pois só existem cinco pacahuaras vivendo em um vilarejo no nordeste da Bolívia, e estão sendo assimilados pelo povo Chacobo.
Não acredito que a cultura Pacahuara morreu, pois nenhuma cultura morre completamente. Uma semente de sua sabedoria foi deixada com aqueles que conviveram com ela ou conheceram-na brevemente. Mas, infelizmente, muito se perdeu com a morte de Bose... E estou triste com isso... Deveríamos todos estar tristes com isso... 
Façamos uma corrente nas redes sociais (e em nossas vidas pessoais também, com orações, pensamentos, enfim) para honrar a memória de Bose e toda a sabedoria que ela representou (e ainda representa). E para lembrar a nós mesmos e aos governos da situação semelhante e injusta que ainda vivem muitas tribos indígenas no Brasil. 

Que Bose esteja em paz e alegria na terra sagrada de seus ancestrais. E que os povos indígenas tenham o devido valor e reconhecimento em nossa sociedade...! 

16 de janeiro de 2013

Conta, ó bardo!



Conta, ó querido bardo,
As histórias antigas
De tempos de outrora
E que ainda guardas de mansinho
Em tua memória.
Conta meu amigo,
Conta calminho,
Conta mansinho,
Conta estrondoso,
Ou então silencioso,
Os versos que ouvira ao redor do fogo.
Conta...
Canta...
Me encanta.
E quem sabe ao cair no sono
Os deuses me venham em brilho gracioso
Soprando-me cantigas de um tempo formoso.
Conta...
Canta...
Me acalanta.
E me diz o segredo do sol, da lua e cada planta.
Me ensina a ouvir as estrelas, as árvores e o vento,
Pra que a magia desperte em mim nesse momento.
Conta, ó querido bardo
O que ninguém mais sabe
O sabor da chuva
E o coração da terra que bate
A mensagem no voo do pássaro
E a passagem escondida no teu passo.
Quem sabe a lembrança saia do esquecimento
E no coração humano desperte um antigo,
Porém, novo sentimento.

(Darona, em Terras Aquirianas, 06/01/2013)

30. Conselhos

E chega o fim da jornada...! Com atrasos, mas chega rs.
Se me é permitido aconselhar, então faço-me das palavras de Gandhi e as dirijo a todos, que seguem o Druidismo ou não.

Mantenha seus pensamentos positivos, porque seus pensamentos tornam-se suas palavras.
Mantenha suas palavras positivas, porque suas palavras tornam-se suas atitudes.
Mantenha suas atitudes positivas, porque suas atitudes tornam-se seus hábitos.
Mantenha seus hábitos positivos, porque seus hábitos tornam-se seus valores.
Mantenha seus valores positivos, porque seus valores... Tornam-se seu destino.
(Mahatma Gandhi)

Aos que estão iniciando nos estudos sobre celtas e druidismo, perseverem, tenham fé, coragem e humildade. Saibam que o caminho não é fácil, pois exige muito estudo e dedicação, mas também não é um caminho tortuoso, pois é por demais prazeroso estudar o que nos toca a alma e seguir o caminho que nos leva de volta para casa...
Aos que estão na estrada há certo tempo, que haja humildade, sabedoria e gentileza para guiar os que estão começando e os que precisam de auxílio.
Àqueles que seguem solitários e desejam encontrar ou formar seu clã/grupo em suas cidades, que tenham força, esperança e dedicação, pois com a ajuda dos Deuses e no momento propício seu clã nascerá.
À família druídica brasileira eu aconselho ou peço apenas que cultivem a união entre si. O Conselho Brasileiro de Druidismo e Reconstrucionismo Celta (CBDRC) está aí, acabou de nascer e aos poucos ganhará força. Mas para isso é preciso que nós nos mantenhamos unidos, respeitando as diferenças que há entre nós e fortalecendo mais ainda nossas semelhanças.

(Uma parte da família druídica brasileira reunida durante o III EBDRC, em Nova Hamburgo, 2012)


No mais, agradeço aqueles que acompanharam meus 30 Dias Druídicos. Foi difícil manter o ritmo, mas com a benção de Brighid e Ogma consegui terminar a jornada, espero que tenha sido a contento de todos e que tenham se inspirado um pouco com minhas palavras. Fico feliz por ter participado dessa corrente dos 30DD, pois aprendi muito refletindo sobre esses temas. Para terminar, transcrevo a tríade celta que mais gosto e que para mim de certa forma resume o Druidismo:

“Honrar os Deuses, não fazer o mal, agir com bravura”.

Sigamos esse conselho, então, e sejamos o melhor que pudermos ser!

15 de janeiro de 2013

29. Futuro


Coisa mais incerta é o futuro... Por mais que recorramos a oráculos para obter respostas e fachos de luz sobre o que vem pela frente, ainda assim é incerto. O futuro depende muito mais de nossas escolhas e atitudes no presente do que de destino. O destino existe? Existe, ao menos acredito que sim. Mas ele é um caminho bifurcado, ou melhor, “multifurcado” (acho que nem existe esse termo rs), e o rumo das coisas depende diretamente de nossas escolhas, de qual caminho (entre muitos) decidimos seguir.

Por mais que alguns acreditem como dado o futuro do planeta, um futuro de destruição e colapso, ainda acredito (junto com tantas outras pessoas) que o rumo dos acontecimentos pode ser mudado. Acredito que a humanidade possa reencontrar a simplicidade e beleza da vida, que a natureza possa se regenerar, e que os seres humanos possam conviver em paz entre si e com os outros seres do mundo. Podem me chamar de ingênua ou o que for, mas acredito nisso. Se não acreditarmos e não fizermos o que é preciso para isso é claro que isso não acontecerá mesmo e então seria melhor “cantar pra subir”. É fácil se acomodar e dizer que o mundo não presta, que a humanidade está perdida, que a cidade é um lixo, e os políticos são uns miseráveis (tá, isso é verdade, mas quem vota neles?). Ao invés de criticarmos, que tal agirmos? Ao invés de esperar que o mundo acabe, que tal melhorar a realidade de vida da sua família, ou do seu bairro, ou sua cidade?
''Enquanto houver um louco, um poeta e um amante haverá sonho, amor e fantasia. E enquanto houver sonho, amor e fantasia, haverá esperança”, disse o conhecido e inspirador William Shakespeare.

Você já ouviu falar sobre a teoria do campo mórfico ou ressonância mórfica? Foi criada pelo biólogo inglês Rupert Sheldrake e segundo essa ideia “os campos mórficos são estruturas que se estendem no espaço-tempo e moldam a forma e o comportamento de todos os sistemas do mundo material” (ARANTES, 2002; retirado desse site). Essa teoria é explicada com base no relato fictício de duas distantes ilhas de macacos que aprendem a lavar raízes antes de comê-las ou quebrar os cocos de forma mais prática (no site referido acima contêm esses relatos). E essa mesma teoria está relacionada a citação seguinte, se não estou enganada, de Jean Shinoda, que gosto muito: "Quando um número crítico de indivíduos mudar a forma de pensar e de se comportar, uma nova era se iniciará".

Grupos de druidismo vêm surgindo aos poucos em locais onde antes não havia nenhum grupo ou onde não havia mais do que um druidista. Ecovilas vêm nascendo em diferentes cidades do Brasil e do mundo. Associações de proteção aos animais, ao meio ambiente e à mulher, por exemplo, surgem e/ou crescem em diversas regiões do país e do globo. Por outro lado, infelizmente, o capitalismo desenfreado também cresce... É uma luta constante entre essas correntes. E o resultado dessa peleja depende exclusivamente de cada um de nós. Não é só a vida da fauna e flora que correm risco, mas também a vida humana. Não somos donos do planeta e não podemos controlar a natureza. O que afeta a Terra, afeta também todos os que vivem nela. Isso não é novidade e temos que parar de agir como se não soubéssemos disso. Para o nosso bem e o de todos os seres no mundo.

Quanto ao futuro do Druidismo, bem, eu só tenho boas expectativas... =)


"A ressonância mórfica tende a reforçar qualquer padrão repetitivo, seja ele bom ou mal. Por isso, cada um de nós é mais responsável do que imagina. Pois nossas ações podem influenciar os outros e serem repetidas" (Sheldrake a revista Galileu).

13 de janeiro de 2013

28. Caminho


(Celtoi Volveci, um evento cultural céltico que acontece na Europa)

A tribo tem lugar para todos e todos fazem parte da tribo. Druida, vate, bardo, guerreiro, artesão, devoto, músico... Todos são importantes e necessários para a comunidade. Muitos grupos que seguem a linha reconstrucionista procuram manter essa ideia de várias funções dentro de um bosque ou grupo druídico, pois é óbvio que não existia apenas druidas ou bardos em uma tribo céltica, mas também guerreiros, ferreiros, agricultores, curadores etc. Algumas funções antigas são possíveis de serem adaptadas e ressignificadas para os grupos de hoje, outras não são, e outras ainda são criadas para suprir uma necessidade do próprio grupo.

No caminho do sacerdócio existem três funções, distintas entre si, mas ao mesmo tempo muito relacionadas. O bardo ou bardisa é o conhecedor profundo da história e dos mitos celtas. É o poeta - ou poetisa - sagrado, que compõe hinos, preces e canções aos deuses e ancestrais sob a influência da inspiração divina. O vate (uátis) é semelhante ao xamã ou pajé, pois é capaz de interpretar os presságios na natureza e nos oráculos, de visitar Outros Mundos e adquirir conhecimentos profundos dos ancestrais e seres feéricos ou encantados. Além disso, são capazes de realizar ou facilitar a cura por meio de preces, banhos, chás, ervas e outras formas de medicina (tradicional e/ou ocidental). O druida ou druidesa reúne de certa forma conhecimentos do bardo e do vate, mas vai um pouco mais além. Ele(a) deve ser versado na história e cultura do(s) povo(s) celta(s), conhecer as leis célticas e, sobretudo, as brasileiras (pois vivemos no Brasil, dã, rsrs) ou do local em que vive. De forma geral, o druida ou druidesa é uma atribuição que resulta do longo tempo de sacerdócio e de vivência no Druidismo, da dedicação ao grupo e, principalmente, da grande sabedoria apresentada por essa pessoa.

As funções não associadas ao sacerdócio são...
O guerreiro(a), que deve ter conhecimento ou mesmo a prática de artes marciais. Deve saber usar no momento adequado a raiva ou o "furor da batalha", não para matar inimigos, mas para conquistar seus desafios. Entre as nove virtudes, ele(a) deve cultivar em especial a Justiça e a Coragem. Sua função principal é proteger a tribo dos "forasteiros" (pessoas, energias e tudo que possa ser hostil à paz do grupo e suas atividades).
O artesão ou artesã é aquele(a) que possui habilidade com as diversas artes (pintura, desenho, artesanato, enfim). Fornece o material que sustenta as ações e a vida na tribo.
O devoto é aquela pessoa que não sente vontade ou vocação de seguir o sacerdócio e também não sente muita afinidade pelas outras funções, mas nutre uma grande ligação com a cultura celta e dedica-se a prática e estudo do Druidismo. O devoto ou devota mantém o culto aos deuses e ancestrais e às práticas diárias espirituais (preces, meditação, ritos etc.).
(Celtoi Volveci)

Outras funções podem ser acrescentadas e elas variam de grupo para grupo. Pode existir, por exemplo, a função do músico, que não é necessariamente o bardo, mas também compõe canções e músicas para as celebrações e festivais do grupo.
É possível também que uma pessoa sinta afinidade por mais de um caminho e queira dedicar-se a duas ou mais funções, como por exemplo, ser artesão e também bardo. Isso é perfeitamente possível, e ótimo até. Mas uma dessas funções provavelmente será a que ela desempenha e se sente melhor. Nesse caso, essa será considerada a sua função principal dentro do grupo.
Há conhecimentos da cultura e espiritualidade celta que todas as funções deverão cultivar, como, por exemplo, as Nove Virtudes e a Inspiração (Awen ou Imbas). O que foi mencionado acima seriam os conhecimentos específicos de cada caminho. Evidente que nem todos os grupos druídicos tem todas essas funções, pois isso requer que haja no mínimo seis ou sete membros no grupo, e são poucos os grupos no Brasil que apresentam mais de três ou quatro membros. Contudo, é um sonho de muitos (inclusive meu rs) de ter uma tribo (tuath; touta) relativamente grande, ao menos o suficiente para acolher essas ou outras funções/caminhos.

Todos nós temos um caminho, uma vocação, carregada de habilidades e afinidades muito particulares. Algo que só nós sabemos fazer e fazer bem, da nossa forma. Chamamos isso de dán, a nossa vocação, nosso dom... E o dom não pode ficar armazenado dentro de nós, ele tem que agir no mundo, tem que escoar, como uma torrente de inspiração, que toca os que estão a nossa volta e retorna para nós, fazendo um ciclo... A Inspiração é como a água, se parada acumula limo e não tem muita serventia, mas se corrente purifica e abençoa o caminho que percorre.

Quando cada pessoa tem uma função e dedica-se a ela dentro de um grupo druídico, ela sente-se realmente parte daquela tribo, daquela cultura, ou melhor, daquela família... Ela sente que pode, e realmente pode, contribuir muito com seu dán dentro do grupo.

Compor uma canção ou música para ser recitada em um festival sagrado, preparar uma deliciosa refeição para ser compartilhada por todos do grupo, aconselhar com sabedoria os que precisam de ajuda, curar por meio de preces, banhos, chás etc. alguém que necessita de uma cura (física e/ou espiritual), enfim, são formas dentre muitas outras de exercer seu dán, sua vocação ou função, dentro do grupo. Para alguns podem parecer ações pequenas, mas para os membros da Tribo e para os Deuses, são ações de suma importância e que merecem devido valor e reconhecimento.

E você, já descobriu seu dom? Já percebeu qual caminho sua alma sente profunda afinidade? Se sim, ótimo! Exerça-o com sabedoria, dedicação e alegria, e tenho certeza que todos serão beneficiados. Se ainda não, não se preocupe, tudo tem seu tempo e os Deuses lhe encaminharão no momento certo ao caminho que você deve trilhar. Você irá descobrir seu caminho ou o caminho descobrirá você. Ou então, crie seu caminho! Deixe ele brotar de dentro de você. No mais, não tenhas pressa... Segue em paz e aproveita a jornada!

10 de janeiro de 2013

27. Um Dia Druídico


Acordo, e procuro me lembrar dos sonhos que tive durante a noite e entender as possíveis mensagens neles contidas. Vou ao banheiro, lavo o rosto, troco de roupa, faço uma oração. Enquanto o café se apronta na cafeteira, faço algumas preces diante do altar. Depois disso, termino de fazer o café da manhã, sento-me na mesa com meu esposo enquanto conversamos e tomamos o café juntos. Recolho os pratos e xícaras, derramo água nas plantas, despeço-me de meu marido, que sai para o trabalho, com beijos e um abraço, e sigo para as tarefas do meu dia (algum trabalho acadêmico, leitura de um livro, ida a faculdade - e logo em breve ao trabalho - preparar o almoço, enfim).
Com o almoço no meu prato, me concentro e faço mentalmente uma oração de agradecimento ao alimento e ao animal que morreu. Almoço calmamente, enquanto assisto televisão ou escuto uma música. No fim da tarde, meu marido chega e preparamos um lanche para nós dois. Às vezes separo um pouco do café e ofereço aos meus ancestrais, em especial a minha avó materna. Durante o banho peço por purificação e renovação das minhas forças.
Sempre que possível, observo o pôr-do-sol pela janela da sala... Apenas contemplando aquele momento. Mais tarde, jantamos e novamente faço uma oração de agradecimento. Se o céu à noite estiver sem nuvens, gosto de observar as estrelas e a lua, e sentir a brisa noturna... Ou mesmo se o tempo estiver nublado, gosto de sentir o cheiro de chuva... Assistimos a um filme ou seriado, e depois vamos dormir, não sem antes eu realizar uma oração.

Meus dias são basicamente assim. Claro, que nem todo dia dá para seguir essa rotina que descrevi, mas faço o possível, ainda mais que capricorniano adora uma rotina... rs.
Deixo também muito a inspiração me guiar... Se me der vontade de ouvir tal música, eu ouço, se der vontade de escrever um poema, eu escrevo, se me der vontade de dançar alguma dança (especialmente circular ^^), eu danço... Enfim, deixo meus ouvidos, coração e sentidos abertos ao que os Deuses querem me dizer e ensinar.
O druida ou druidista não tem um dia druídico só quando irá comemorar um Imbolc ou Samhain. Evidentemente, que nos dias dos festivais dedicamos um pouco mais de atenção e práticas religiosas, mas os outros dias do ano não devem ser apenas “um dia normal do ano”. Nenhum dia é igual ao outro, e nenhum pôr-do-sol é igual ao de ontem. O Sagrado se manifesta tanto nos dias de pico do ciclo anual (os festivais) quanto nos outros dias. A verdade é que os Deuses e ancestrais estão presentes em todo o momento, ao nosso lado, sobre nós e abaixo de nós. Só nos resta perceber a presença deles. Viver todos os dias de forma druídica é viver uma vida mais plena de consciência, sacralidade e felicidade. 

(Luminária no altar dos ancestrais, foto de M. Faro)

9 de janeiro de 2013

26. Distrações


Ah é... Distrações... Deixei-me levar muitas vezes pela distração enquanto escrevia os 30 Dias. Às vezes isso era bom, porque pensava mais sobre o tema, e certos momentos as palavras vinham quase prontas na minha mente, por inspiração e intuição. Mas outras vezes era ruim, porque deixava a distração tomar um rumo que não deveria, e acabava perdendo muito tempo e às vezes o dia.

O mundo atual nos enche de distrações, algumas são úteis, outras, definitivamente não. Televisão, consumismo, internet... Ah essa internet, e em especial, o facebook, esse “mardito” rs. Por um lado é maravilhoso, pois me aproxima de pessoas que estão distantes de mim no momento, mas por outro é uma praga, pois prende a atenção por horas enquanto tenho uma penca de coisas a fazer... É, eu sei que você me entende rsrs. Quem nunca?
O nosso desafio é saber distinguir justamente qual distração nos é útil e qual não é. Muitas vezes estamos tão focados num trabalho ou tarefa que uma distração se torna saudável e necessária. Sair para caminhar um pouco, assistir a um bom filme, ler um livro, ouvir uma música, tocar um violão, acessar a internet, muitas vezes clareia a nossa mente e traz ideias que provavelmente não teríamos se continuássemos concentrados (e cansados) diante da tarefa. O problema é quando nos deixamos distrair demais e esquecemos o nosso foco.

Não vejo nenhum problema em pessoas que gostam de assistir novelas e futebol, o problema é quando a pessoa não vive sem isso ou quando esse tipo de distrações está fritando seus cérebros... Cuidado com o que a mídia e a cultura de massa impõem às nossas mentes, olhos e ouvidos. “Reality shows”, músicas com letras vazias e baixas, consumismo cego, jornais cuja página principal mostra foto de mulher seminua ao lado de um corpo morto de uma pessoa... Isso tudo só nos tira a atenção do que é importante e nos idiotiza. Como diz o velho ditado, “meu ouvido não é pinico”, mas eu acrescentaria “meu ouvido, meus olhos e minha mente não são pinico”.
Somos afetados de alguma forma por aquilo que vemos e ouvimos. As imagens, cheiros e sons afetam positivamente ou não nossas mentes e corpos. E isso não é nenhuma especulação, cientistas já comprovaram isso. Se você tivesse consciência do que cada coisa que você ouve ou vê provoca em seu corpo e mente, o que você faria? 

8 de janeiro de 2013

25. Pisando Leve

Esse tema relaciona-se com o “Vida Consciente”, que escrevi há uns dias atrás. Mas vai mais além... A ideia de pisar leve me faz pensar em cuidado. Cuidado com a Terra que nos sustenta e acolhe, cuidado com os seres a nossa volta, animais, vegetais, cuidado com nossos semelhantes, cuidado com nós mesmos...
Enquanto pensava sobre o que escrever nesse tema, deparei-me na internet com a foto (abaixo) de uma preguiça e seu filhote. E percebi que a preguiça é o animal por excelência que representa o “pisar leve” no mundo, além de ser fofa demais!


Seus movimentos calmos e lentos, seu olhar sereno e um “sorriso” manso, nos mostram o oposto do que a sociedade nos instiga a ser: apressados, barulhentos e preocupados, em grande parte com coisas fúteis.
A preguiça, com seu jeito manso e calmo de viver, nos mostra a paz que precisamos ter. O olhar de uma preguiça me passa justamente isso, paz.

Se você não tem o hábito de “pisar leve”, tente passar um dia sendo como a preguiça, calmo, silencioso, sereno... Para alguns isso pode ser tremendamente difícil, mas tente, mesmo que só por um dia. Se não conseguir, tente outros meios. Meditação, terapia, música, um banho no mar ou rio, dança circular, dança do ventre, prática de um esporte... Há tantos meios para encontrar a paz. O estado de “ser preguiça” ou de “pisar leve” é muito mais um estado interior e um modo de ser e viver. Algo que brota de dentro pra fora, que transborda e reflete ao redor... E até contagia quem está perto.
Que tal começarmos a ser um pouco mais como o bicho-preguiça? Fazer uma pausa, ler um livro, dedicar-se a uma arte, compor poemas ou canções, estar na companhia de pessoas queridas, dormir, meditar, silenciar, ouvir, sentir... Com certeza seremos mais felizes, ou no mínimo, mais serenos.

6 de janeiro de 2013

24. Trabalho

No Druidismo, com o foco reconstrucionista, há lugar para todos. Artesãos, guerreiros, druidas, bardos, vates, devotos... Todos são bem-vindos e têm reconhecida importância para o clã ou grupo. Nenhuma função é inferiorizada. Todos exercem suas funções com dedicação e prazer, pois cada pessoa tem a habilidade e o dom para ser aquilo que ela escolheu e que os deuses lhe destinaram. Exercer seu trabalho com excelência é uma virtude muito valorizada no Druidismo e RC.

Essa virtude não se restringe só a função no grupo druídico, mas se estende a vida profissional da pessoa. Médicos, professores, advogados, engenheiros, psicólogos, técnicos, diaristas, prestadores de serviços gerais, artistas, músicos, comerciantes, donas de casa... Não importa qual seja a sua profissão, exerça seu trabalho com dedicação, amor e excelência, pois não só a sociedade lhe verá com bons olhos, mas também os Deuses.


Fazer um trabalho com excelência e prazer é também uma forma de sacrifício/oferenda aos deuses e ancestrais. Diante de algum desafio no seu trabalho, peça ajuda e proteção aos deuses patronos daquela arte. E quando concluir a tarefa agradeça a eles e ofereça um “fruto” do seu trabalho. Advogados, professores, mestres e artistas tem afinidade particular com Ogma, Lugh, Dagda e Brighid. Médicos, enfermeiros, terapeutas e técnicos da saúde, com Brighid, Airmid, Dian Cecht, Belenos, Sulis e Endovelicon. Pescadores, marinheiros e pessoas que trabalham no mar ou nas águas, afinam-se principalmente a Manannan Mac Lir, Boann, Sequana. Policiais, seguranças, atletas e lutadores, com Morrighan, Ogma, Scathach, Cú Chullain e Lugh. E por aí vai. Mas isso não é regra. Médicos, por exemplo, podem perfeitamente afinarem-se a Morrighan. Esse tipo de afinidade que me refiro aqui está relacionada principalmente ao trabalho, ao “saber fazer” de cada pessoa, não exatamente a afinidade espiritual com as deidades (acredito que cada pessoa tenha um, ou mais, patrono ou matrona, que guia, inspira e protege a pessoa durante toda a sua vida e para além dela). De qualquer forma, afinidade é algo muito relativo e deve ser levada em conta a individualidade de cada pessoa.

Encarar o trabalho do dia-a-dia com dedicação e prazer é algo que traz benefícios para as pessoas a sua volta (ligadas ao seu trabalho ou não) e, sobretudo, a você mesmo. Nada pior do que uma pessoa que é infeliz no seu trabalho. Não só mau-humor ela terá, mas também sua saúde e emoções serão prejudicadas. Claro, que nem todos os dias acordaremos com alegria no peito, disposição e riso fácil. Mas se ao menos tivermos o compromisso de exercer com excelência e boa vontade nossas tarefas, o cansaço e a indisposição amenizarão, e a vida será mais leve e gostosa, com certeza.

“Eu me levanto hoje com a graça dos Deuses,
Que eu tenha a força de um touro,
A sabedoria do salmão,
A valentia do javali,
A beleza da borboleta,
A graça e o encanto do cisne.
Que haja excelência sobre minha casa,
Excelência sobre meus amigos,
E excelência sobre minha parte do trabalho”.
(Prece ao acordar).

5 de janeiro de 2013

23. Comunidade


("Celtoi Volveci", um evento moderno cultural céltico na Europa)

O Druidismo é uma das religiões no mundo mais focadas na vida comunitária, no sentido de Clã, e Clã quer dizer família, e família, como escrevi no dia 22, existe a de sangue e a de alma.
Mesmo que uma pessoa afirme praticar “solitariamente” o Druidismo, vai chegar um momento na vida dela em que sentirá uma necessidade de compartilhar conhecimentos e celebrar em conjunto os festivais. Faz parte do caminho druídico e reconstrucionista celta o sentir-se parte de uma família, um clã, um grupo ou “bosque”. É um sentimento quase que intrínseco em nós.

A imagem de um grupo de pessoas que se querem bem sentadas ao redor de uma fogueira ou lareira, cantando músicas antigas e novas, contando histórias dos antepassados, do dia-a-dia ou mesmo histórias engraçadas, partilhando de boa bebida, boa comida e claro, boa conversa, é algo que muito, mas muito mesmo nos agrada e conforta a alma. Pois é exatamente aí que podemos perceber a essência, a alma da(s) cultura(s) celta(s)... Mesmo que os antigos celtas estivessem divididos em várias tribos, umas aliadas outras inimigas, o sentimento de lealdade, amizade e alegria é que buscamos ressaltar.

(Foto durante o III EBDRC, em novembro de 2012)

Muitas pessoas no Brasil seguem o caminho druídico individualmente simplesmente porque não encontraram ainda outras pessoas interessadas para formar um grupo. A maioria dos grupos druídicos se concentra no sudeste brasileiro (principalmente no estado de São Paulo), mas aos poucos novos grupos ou bosques vão surgindo em outras cidades e regiões do Brasil. Hoje podemos encontrar grupos, além de São Paulo, em Curitiba, Porto Alegre, Florianópolis, Rio de Janeiro, João Pessoa, Recife, Salvador, Brasília, Belém... Alguns já existem há certo tempo e possuem as raízes fortes, outros ainda estão se construindo e aos poucos se fortalecendo.

Provavelmente também existem diversas pessoas espalhadas pelo Brasil estudando e seguindo o Druidismo, ainda timidamente, mas que não tardará muito para entrarmos em contato com elas ou elas entrarem em contato conosco. Com “conosco” quero dizer a “Comunidade” ou “Família Druídica Brasileira”, pois hoje creio que podemos nos sentir e nos denominar dessa forma. Não sem exagero, pois recentemente, em 2012, nasceu o que há meses ou mesmo anos se sonhava e planejava: o Conselho Brasileiro de Druidismo e Reconstrucionismo Celta. O nome é grande, mas é porque a família também é grande, e isso implica em diversidade, mesmo na unidade, e também em respeito. Dentro do Conselho há representantes no momento de quase todos os grupos do Brasil e de diferentes ramos. E apesar das diferenças, pequenas na verdade, são as semelhanças e os sonhos em comum que nos unem nessa causa por reconhecimento e respeito no âmbito social e legal, além de outras coisas tão importantes quanto.

Se você ainda não encontrou um grupo em sua cidade, tenha paciência que um dia encontrará ou construirá. Enquanto isso, continue estudando e vivenciando sua espiritualidade. O Druidismo é como uma semente que se espalha no vento... Como a kapok, a linda semente da mãe Samaúma... Mas nosso intuito não é espalhar o Druidismo para agregar mais adeptos, num sentido proselitista. Pelo contrário, não apoiamos nenhuma forma de proselitismo ou fundamentalismo. Acredito que cada um tem o seu caminho... Aquele que toca a sua alma. O mundo é diverso, e é na diversidade do mundo, de seus povos, crenças e culturas que reside a sua beleza.

O Druidismo é como uma semente no sentido de que mesmo que uma pessoa decida não seguir esse caminho, se ela ao menos compreender uma pequena parte do que é Druidismo (e de modo geral o Paganismo ou Politeísmo) algo novo irá brotar dentro dela. Uma nova perspectiva de mundo, um novo olhar, uma nova forma de vida, uma semente... Mesmo que essa pessoa siga por outras sendas depois, ela nunca mais vai olhar o mundo e as pessoas com os olhos de antes. E o mundo para ela, e quem sabe para outras, será um outro mundo... Um mundo melhor (assim esperamos).


Pois uma das coisas fundamentais que se aprende no Druidismo é que vivemos em comunidade. Ou melhor, vivemos em Comunidades dentro de uma Grande Comunidade. E não podemos ignorar nem cortar os laços que nos ligam. Devemos respeitar esses laços e zelar para que a harmonia e a paz se façam não só em uma, mas em todas as comunidades do mundo. Utopia? Quem sabe. Mas como já disse William Shakespeare, não é de pó e matéria que somos feitos, mas sim de sonhos. “Nós somos do tecido de que são feitos os sonhos”, ele escreveu.

(Dança Circular Sagrada, durante o III EBDRC)

E nas palavras de Eduardo Galeano, “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”.
Mais do que qualquer outra coisa, o que motiva nossas vidas são os sonhos. Para uns, utopia. Para outros, metas. Para os druidas (e druidistas), é a inspiração em ação. 

(Fogueira sagrada no último dia do III EBDRC)

3 de janeiro de 2013

22. Família e Amigos

Achei muito adequado esse tema estar relacionado, família e amigos. Tenho a minha família de sangue, mãe, pai, irmãs, tios e tias, avós, primos etc., e minha família de alma, amigos e amigas (perto e distantes), sendo que uns considero mesmo como irmãos ou irmãs.
A família de sangue, bem, nasci nela já e se foi por escolha ou não, não sei, mas amo a todos, apesar das diferenças e discussões, são minha família. Cuidaram e cuidam de mim, assim como cuido e cuidarei deles.

Minha família é católica, e quando comecei a demonstrar interesse ainda na adolescência pelas religiões antigas e paganismo sofri algumas (na verdade, muitas) discriminações dentro de casa. Não podia realizar rituais, acender velas ou comprar livros sobre o assunto que já ouvia coisas absurdas, como “isso não é coisa certa”, “isso não é religião”, “isso é perigoso”, “isso é do mal”... E coisas semelhantes. Mesmo que eu tentasse explicar, a discussão entre nós era inevitável. Mas com o tempo, minha família foi vendo que as “coisas que eu lia” não me faziam mal, muito pelo contrário, e a situação foi enfim amenizando e melhorando até o ponto de não haver mais discussões sobre isso e até mesmo de familiares próximos me pedirem para “colocar cartas” para eles (e até hoje ainda me pedem, e eu faço com muito prazer!). No fim, com paciência e amor de ambas as partes houve compreensão e respeito.

Sei que muitos que estão estudando o Druidismo (ou outro ramo do paganismo) estão passando por situação parecida a que vivi, e sei que é difícil. O que posso lhes dizer é tenham paciência e sabedoria para enfrentar essa fase, pois ela é justamente isso, uma fase. Tente tirar lições para sua vida desses desafios que lhe são postos. Lembre-se que o ferro precisa ser várias vezes batido para torna-se forte o bastante para uma espada, e é assim que A Senhora da Forja prepara seus filhos(as). E que um(a) guerreiro(a) é considerado valoroso não por quantas batalhas venceu, mas por quantas batalhas, vencidas e perdidas, sobreviveu e o quanto aprendeu com elas. E é assim que A Grande Rainha testa seus filhos(as). No mais, tenha em mente que um dia você terá a sua casa, o seu canto, e será livre para exercer a sua espiritualidade do jeito que quiser.

A amizade sempre foi muito valorizada na cultura irlandesa, e céltica como um todo. É conhecida a obra de John Donohue, “Anam Cara” (termo traduzido como “Amigo de Alma”), em que contêm a belíssima Oração da Amizade:

“Que sejas abençoado com bons amigos.
Que aprendas a ser um bom amigo para ti mesmo.
Que sejas capaz de viajar àquele lugar na tua alma onde existe o grande amor, calidez, sentimento e perdão.
Que isso te modifique.
Que isso transfigure o que é negativo, distante ou frio em ti.
Que sejas apresentado à verdadeira paixão, parentesco e afinidade da vinculação.
Que prezes os teus amigos.
Que sejas bom para eles e que estejas lá para eles; que eles te tragam todas as bênçãos, desafios, verdade e luz de que necessitas para a tua viagem.
Que nunca fiques isolado.
Que sempre fiques no sereno refúgio da vinculação com o teu Anam Cara”.

Tenho grande carinho pelos meus amigos e amigas do caminho druídico. Mais do que amigos, eles são meus irmãos e irmãs, pois alguns eu conheço desde quando comecei a engatinhar no Druidismo (e sinceramente, ainda acho que estou engatinhando rs), há cerca de sete ou oito anos atrás. Wallace, Andréa, Simão e Marcos, foram os primeiros que tive contato, além de amigos, eles foram (e ainda são) meus mestres e mestras, ensinando-me muitas coisas e indicando o caminho quando precisava de auxílio. A eles sou eternamente grata e nutro um enorme sentimento de amizade e carinho.
Seguindo na estrada encontrei outros amigos-irmãos, como Eldrich, Alessah, Endovelicon, Rowena, Renata, Hugo, Rafael, Náthaly, Marcela, Vera, Juliana, JP, Sheila, João, Bellovesos, Marina, Jéfferson, Suênia, Marcílio, Paula e tantos outros (porque a família é grande! e tenho certeza que esqueci de citar algum nome, mas estão todos no meu coração ^^).
Com alguns tenho mais contato do que com outros, e também mais afinidade, mas sinto que todos fazemos parte da mesma família. E é incrível como somos invadidos por um sentimento de união, amizade, amor e alegria quando nos encontramos (quem já esteve em um Encontro Brasileiro de Druidismo e Reconstrucionismo Celta, sabe muito bem do que estou dizendo), e também da saudade que bate quando nos distanciamos após um EBDRC (e com a saudade vem a ansiedade para logo participar do próximo!).

Em muitos momentos de dificuldade que passei, só o fato de pensar nessas pessoas e nos momentos maravilhosos que vivi ao lado delas me deu forças para prosseguir. A lembrança das rodas de conversas, da música e boa bebida ao redor de uma fogueira, da celebração conjunta de ritos sagrados, da alegria entre amigos... aquecia (e aquece) meu coração com bons sentimentos e enche de alegria minha alma. Alguns podem achar isso tudo meio exagerado. Que achem, não me importo. Mas que essas coisas a gente só sente quando os laços que nos une são realmente fortes e quando somos mesmo uma família, isso é. E é o que somos na verdade, uma família de alma, a família druídica brasileira.
À minha família de sangue e de alma quero dizer apenas muito obrigada pelos desafios e pelas alegrias, e que eu amo muito todos vocês...! :)

(Foto durante o III EBDRC)


"E um jovem disse, Fala-nos da Amizade.
E ele respondeu, dizendo:
O vosso amigo é a resposta às vossas necessidades.
Ele é o campo que cultivais com amor e colheis com gratidão.
E é o vosso apoio e o vosso abrigo.
Pois ides até ele com fome e procurai-lo para terdes paz.
Quando o vosso amigo fala livremente, vós não receais o "não", nem retendes
o " não".
E quando ele está calado o vosso coração não deixa de ouvir o coração dele;
Pois na amizade, todos os pensamentos, todos os desejos, todas as esperanças
nascem e são partilhadas sem palavras, com alegria.
Quando vos separais de um amigo não fiqueis em dor, pois aquilo que mais
amais nele tornar-se-à mais claro com a sua ausência, tal como a montanha, para
quem a escala, é mais nítida vista da planície.
E não deixeis que haja outro propósito na amizade que não o aprofundamento
do espírito.
Pois o amor que só procura a revelação do seu próprio mistério, não é amor
mas uma rede lançada que só apanha o que não é essencial.
E deixai que o que de melhor há em vós seja para o vosso amigo.
Já que ele tem de conhecer o refluxo da vossa maré, que conheça também o
seu fluxo.
Pois para que serve o vosso amigo se só o procurais para matar o tempo?
Procurai-o também para viver.
Pois ele preencher-vos-à os desejos, mas não o vazio.
E na doçura da amizade que haja alegria e a partilha de prazeres.
Pois é nas pequenas coisas que o coração encontra a frescura da sua manhã."

("Sobre a Amizade", de Khalil Gibran, em O Profeta).