graça compreensível,
conhecimento reunido,
fluente inspiração
poética como o leite do peito,
é o auge da maré do
conhecimento,
união de sábios,
correnteza de
soberania,
glória dos humildes,
maestria das palavras,
rápido entendimento,
sátira enrubescedora,
artesão de histórias,
cuidando dos alunos,
procurando princípios
obrigatórios,
distinguindo as
complexidades da linguagem,
movendo-se rumo à
música,
propagação da boa
sabedoria,
nobreza enriquecedora,
enobrecendo os
não-nobres,
exaltando os nomes,
relatando louvores
por meio do trabalho
da lei,
comparação de
dignidades,
a bebida nobre em que
é fervida
a raiz verdadeira de
todo conhecimento,
que entrega em razão
do respeito,
que cresce em razão da
diligência,
cujo êxtase poético
põe em movimento,
cuja alegria vira,
que é revelado por
meio da tristeza,
proteção que não
diminui,
canto o Caldeirão do
Movimento.
(Caldeirão da Poesia, atribuída a Amhaergin, tradução de
Bellovesos)
Só mesmo uma pessoa muito
insensível ou ignorante para não gostar de poesia. Nem todos possuem dom para
escrever poesia, mas todos apreciam ler ou ouvir uma.
Melhor do que a prosa, a poesia
consegue expressar os sentimentos, sensações e intuições de forma magnífica e
profunda, justamente porque a linguagem de todas elas é a mesma, a simbólica.
Acho que não existe uma religião que
dê tanto destaque a poesia (ou a arte, em geral) e a quem a escreve como o
Druidismo. Os bardos ou fíli eram (e são) aqueles que, depois de passar por um
longo treinamento de memorização e estudos, detinham a memória de várias poesias
e histórias da comunidade. Guardavam-nas no “Santuário que Preserva” e também criavam
novas poesias e contos sob a inspiração sagrada.
Quem pensa que é fácil escrever
uma poesia verdadeira engana-se. Tente transformar em palavras seus sentimentos
mais profundos e intuições mais remotas... Só mesmo sob a luz da inspiração e
sabedoria é que surgem as palavras certas e plenas de verdade que irão compor a
poesia. E era (é) essa inspiração e sabedoria que os bardos buscavam sempre que
precisavam de respostas e orientações; encontrar e acessar a Inspiração fazia
parte de seu treinamento.
Há um texto medieval irlandês atribuído
a Amhaergin como autor, chamado de Caldeirão da Poesia. Nesse texto-poema
fala-se sobre três caldeirões que existem em todo ser humano e são o Caldeirão
da Incubação, do Movimento e da Sabedoria. A posição deles pode estar de lado,
invertida ou para cima, dependendo muito do momento em que o indivíduo está
vivendo e, principalmente, de seus sentimentos, ou seja, a alegria e tristeza. Se
estivermos alegres os caldeirões se movimentarão para cima e isso é bom, pois a
inspiração pode circular livremente por eles e transbordar para nossa alma e
corpo. Se estivermos tristes, eles emborcarão e isso é ruim, pois dificulta a circulação
da inspiração/energia e pode provocar doenças emocionais e físicas.
Acredito que a arte, em especial
a poesia e a música, seja a linguagem por excelência do Sagrado. É pela arte sagrada
que os Deuses, Antepassados e Seres da Natureza se comunicam com a gente, e que
nós nos comunicamos com eles. Não é por acaso que a divindade era chamada de
Óran Mhor, a Grande Canção, no cristianismo irlandês. E também não é a toa que
num ritual ou festival celta, antigo e moderno, a presença da música, dança e
poesia é tão forte.
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